segunda-feira, 22 de dezembro de 2014
terça-feira, 4 de novembro de 2014
quinta-feira, 25 de setembro de 2014
JUSTIFICATIVA DO PROJETO “PRESERVANDO A
MEMÓRIA HISTÓRICA DO MUNICÍPIO.
Santana do
Cariri, situada no extremo sul do Ceará, é um município com potencial diverso
em arte, cultura e tradição. Às vésperas de completar 130 anos de emancipação
política, tem uma história rica e marcante com fatos que incluem os confrontos
políticos do coronelismo, a primeira prefeita do Ceará, o primeiro processo de
beatificação do estado introduzido no Vaticano, as riquezas artesanais,
naturais e paleontológicas, dentre outras.
Como historiador, educador e amante de minha terra
natal, ao longo de todos esses anos consegui reunir um vasto material sobre o
município de Santana e a Região do Cariri, sempre com o intuito de resgatar e
preservar sua memória. São coleções diversas que incluem desde livros raros,
revistas, jornais, recortes com matérias marcantes publicadas, importantes
documentos, etc. até moedas antigas, imagens e objetos sacros, móveis e
utensílios de época. Temas que englobam saberes e fazeres, imagem e som,
registros em áudio, vídeo e outros.
A ideia seria organizar uma instalação com todo
esse material em forma de exposição temática permanente intitulada “Preservando
a Memória Histórica do Município”, mostrando a toda população, diferentes
espaços contendo:
1-
MEMÓRIA
ICONOGRÁFICA (fotos, álbuns, acervo da primeira professora
formada, painéis, retratos, etc.);
2-
MEMÓRIA LITERÁRIA (livros,
revistas regionais, cordéis, cartilhas, folders, informativos, documentos,
publicações de poetas e escritores regionais, recortes de jornais e revistas;
acervo de Estudos Regionais e Conhecimentos do Município, e outros.);
3-
ARTE SACRA
(Objetos e imagens sacras, paramentos sacerdotais e religiosos, móveis
etc.);
4-
SABERES
E FAZERES (ambientações de interiores de casas, mostrando costumes e
tradições como a Renovação do Coração de Jesus, o uso de candeeiros, lamparinas
e ferro de engomar à brasa, meios de comunicação, estilos, etc.;
5-
COLEÇÕES (selos, moedas, cartões
postais, cédulas, canetas, lembranças póstumas, chaves...);
6-
PINACOTECA SANTANENSE (obras de artistas
plásticos santanenses: pintura, desenho, escultura, reciclagem, etc.);
7-
IMAGEM E SOM (LP’s, compactos, fitas K-7
e VHS, TV’s preto e branco, máquinas fotográficas
e
filmadoras, radiolas, rádios, máquinas de datilografia, mimeógrafo, monóculos,
toca
discos, telefones com disco e manuais...).
Na Exposição, haveria um espaço destinado à mídia
digital, com todo esse material digitalizado, guardado em arquivos, para
consulta popular, assim como, um conjunto multimídia completo, para
apresentação de áudio e vídeo em telão, dos bens imateriais como: filmagens de
eventos e fatos marcantes contendo apresentações teatrais, artísticas e
religiosas; danças folclóricas; Coroação de Nossa Senhora, lapinha, pastoril,
cantatas natalinas com corais, encenações da Semana Santa, entrevistas e
depoimentos de artistas regionais como Patativa e Maranhão; poesia, cantoria,
música, etc.).
No período preparatório do projeto seriam
disponibilizadas bolsas para jovens estudantes que se dispusessem a trabalhar
na organização da exposição, no contra turno escolar, em atividades referentes
à digitalização, recuperação, guarda e disposição dos materiais, assim como
oficinas afins.
O Objetivo precípuo do Projeto seria guardar
adequadamente todo esse acervo, mostrar para a população, dar oportunidade aos
jovens, e cuidar para que a memória do município e da região não se perca nas
brumas do tempo.
quarta-feira, 10 de setembro de 2014
segunda-feira, 8 de setembro de 2014
A FEIRA DO CRATO
Um dos eventos mais movimentados da
região do Cariri no início da década de 70 era a Feira do Crato. Sempre às
segundas-feiras, reunia comerciantes, compradores, artistas populares e
visitantes de todo lugar.
Mamãe, que negociava com tudo: legumes,
porco, galinha, ovos, verduras etc., sempre viajava para o Crato para vender
alguma coisa e, com o apurado comprar outras para as necessidades do lar.
Havia sempre uma disputa: qual dos
filhos viajaria com ela. Apesar de ser o percurso em cima de caminhão e no frio
da madrugada, sempre era uma exótica novidade. Todos queriam ir. Um dia,
finalmente, chegou a minha vez. Fiquei eufórico com a possibilidade de conhecer
o Crato. Acordamos de três para as quatro horas da madrugada. Banhei-me, vesti
uma roupa melhorzinha, tomei café com pão. Mamãe já havia apeado as galinhas,
arrumado as cestas de ovos, os sacos com arroz, feijão, milho e fava, que eram
vendidos na cuia ou no litro. Tudo pronto, saímos em direção à Rua Grande para
arrumar as coisas em cima do caminhão dos “Bráulio” e aguardar a hora da saída.
Quando nos acomodamos em cima dos
sacos, caixotes e lonas o caminhão começou a movimentar-se rumo ao sítio
Cancão. A viagem para o “Cariri” ou “Cratinho de Açúcar” como falavam, era pela
Ladeira da Serra do Pontal, muito temida por todos, por ser íngreme e cheia de
abismos. Quanto mais o veículo aumentava a velocidade mais depressa a paisagem
passava, parecendo até que as árvores é que corriam apressadamente. Eu me
deliciava com aquilo.
O ronco e os rangidos do caminhão, o remelexo
causado pelos “catabís”, a poeira e o vento, em nada se comparavam ao frio de
cima da serra, nas entranhas da Chapada do Araripe, complementado pela neblina
e a névoa. Ora nos cobríamos com uma lona, ora a tirávamos para termos uma
visão melhor da floresta. Certo é que, mesmo amontoados uns com os outros,
passageiros, chapeados e viajantes, o frio era de congelar.
Quando alcançamos a estrada plana em cima da
serra, o caminhão corria mais e o frio aumentava. Com os dedos dos pés
dormentes, não conseguia senti-los. Embaixo da lona, comecei a beliscar meu pé
para ver se a dormência melhorava; e quanto mais eu beliscava mais a dormência
aumentava; eu não conseguia sentir meus pés. Daí veio-me a ideia de levantar a
lona e verificar o que estava acontecendo. Foi então que eu pude perceber que o
pé que eu beliscava não era o meu, e sim o de um senhor que estava sentado ao
meu lado, com os pés dele em cima dos meus. Fiquei meio envergonhado achando
que o senhor ia me dizer poucas e boas, mas ele apenas olhou-me silenciosamente
e mudou os pés de lugar. Creio que o frio amenizou a dor dos beliscões. Baixei
a lona e por volta das sete da manhã chegamos ao Crato. Muitos prédios, muitos
carros. Um vaivém tresloucado de pessoas.
O caminhão parou em frente a um grande
e movimentado mercado público chamado “Redondo”, que ficava no centro da
cidade, à beira do Canal. Era um aglomerado de quiosques, bodegas, bancas de
venda e camelôs com o mais variado comércio; muitos tocadores e repentistas
trazendo alegria.
Descemos do Caminhão, pagamos as
passagens e fomos procurar o “ponto” comercial dos meus tios, onde minha mãe
vendia suas coisas. Depois da bênção e das boas-vindas, haja café com bolo, pão
doce e aguado, caldo; mais tarde picolé, sorvete, cocada, pipoca, cajuína,
tijolo de buriti... Quando mamãe terminava de vender os frangos, ovos,
“bacurins”, legumes, íamos para as compras nas lojas e pelas ruas. Fazíamos uma
feira, e quando dava, comprávamos até coisas para casa: utensílios,
eletrodomésticos, e roupas.
A volta já à tardinha era melhor porque
não tinha tanto frio, só o vento, mas o aglomerado de coisas em cima do
caminhão era bem maior: caixas, sacos, colchões de mola, camas, móveis,
material de construção... A gente se ajeitava para a volta, rezando para chegar
em paz na nossa casa, com os poderes do Padrinho Cícero Romão Batista, do
“Santo” Frei Damião e de Senhora Sant’Ana.
Já em casa, apesar
de cansados, tínhamos muitas novidades para contar sobre a aventura de viajar
para a Feira do Crato.
Raimundo Sandro
Cidrão
terça-feira, 2 de setembro de 2014
terça-feira, 26 de agosto de 2014
SONHO
Às vezes em
momentos de descontração fujo da realidade e viajo candidamente para o universo
dos meus sonhos. Nesse misto de utopia e realidade, vejo minha cidade brilhar
culturalmente transformada como num conto de fadas, artisticamente mudada como
num milagre, aquele que ocorre nas mãos dos artesãos, quando transformam sua
matéria prima em obras de arte.
Nesse
sonho posso ver as pessoas tendo acesso a bens culturais diversos.
Numa
galeria há um espaço com uma “Pinacoteca Santanense”, e a população visita
exposições variadas, que contemplam artistas da terra e dão lugar também a “Da
Vinci”, “Van Gogh”, “Tarsila”, “Picasso” e outros.
Os
professores e estudantes participam de uma grande bienal, uma Feira de Livros;
historiadores, poetas e escritores regionais estão em cada estande, ao lado dos
já consagrados Paulo Coelho, Cecília, Rachel, Drummond, Sheldon, etc.
Nos
finais de semana as famílias vão ao Teatro Municipal assistir peças que estão
em cartaz ou shows e musicais; vão ao cine ver a projeção do último filme
lançado, ou a uma galeria apreciar artes visuais diversas; vão aos museus,
bibliotecas, casas de cultura.
Nesse
sonho também vejo um Centro de Atendimento ao Turista com muitas associações
comunitárias de artistas e artesãos mostrando, divulgando e comercializando
seus produtos. Há oficinas de artes plásticas, reciclagem, desenho,canto, dança...
Grandes
espetáculos teatrais e musicais ao ar livre são mostrados em pontos estratégicos
da cidade, num show de talento, iluminação, cores e efeitos especiais. Os
expectadores silentes e educados assistem cada cena, e ao final de cada uma,
aplaudem e reverenciam seus artistas.
A
cidade está limpa, organizada e bem cuidada nos mínimos detalhes. Há hotéis,
pousadas e albergues com infraestrutura, bom atendimento; pessoas simpáticas e
cordiais em todo entorno, conhecedora de seus direitos e conscientes dos seus
deveres.
-Sandro!
Sandro acorda!... Você está dormindo?
-
Não, estava apenas sonhando acordado, mas enquanto este sonho meu não vira
realidade, eu vou tentando fazer a minha parte, cantando os versos de Milton:
“Vendedor de sonhos
tenho a profissão viajante
de caixeiro que traz na bagagem
repertório de vida e canções
tenho a profissão viajante
de caixeiro que traz na bagagem
repertório de vida e canções
E de esperança
mais teimoso que uma criança
eu invado os quartos, as salas
as janelas e os corações.
mais teimoso que uma criança
eu invado os quartos, as salas
as janelas e os corações.
Frases eu invento
elas voam sem rumo no vento
procurando lugar e momento
onde alguém também queira cantá-las.
elas voam sem rumo no vento
procurando lugar e momento
onde alguém também queira cantá-las.
Vendo os meus sonhos
e em troca da fé ambulante
quero ter no final da viagem
um caminho de pedra feliz.
e em troca da fé ambulante
quero ter no final da viagem
um caminho de pedra feliz.
Tantos anos contando a história
de amor ao lugar que nasci
tantos anos cantando meu tempo
minha gente de fé me sorri
tantos anos de voz nas estradas
tantos sonhos que eu já vivi...”
de amor ao lugar que nasci
tantos anos cantando meu tempo
minha gente de fé me sorri
tantos anos de voz nas estradas
tantos sonhos que eu já vivi...”
Raimundo Sandro Cidrão
Arte-educador
quarta-feira, 20 de agosto de 2014
terça-feira, 19 de agosto de 2014
Depois dos 40
DEPOIS DOS 40
Depois dos 40 pude perceber
Que a vida pode ser mais bela
Pois com a maturidade vem a experiência
Os gostos mudam; os valores mudam
A forma de ver o mundo muda também.
Pude descobrir e viver novas experiências.
Aprendi a me valorizar e a valorizar mais as pessoas
Ouvindo mais, aceitando mais, tolerando mais.
Depois dos 40 notei que cada marca deixada pelo tempo
Tem sua significação.
Que as pessoas podem nos amar, nos respeitar e nos vaalorizar
Por cada ruga em nosso rosto, por cada fio de cabelo branco,
Pelos sinais na pele, nas mãos.
Aprendi que é uma dádiva nascer, crescer, envelhecer
E depois morrer sereno e lúcido.
Poucos conseguem essa ordem natural da vida.
Percebí a importância que tem a maturidade, a terceira idade.
Depois dos 40 pude constatar
Que o prazer de beber está em degustar um aperitivo
E não em tentar consumir toda cachaça do mundo em uma só noite.
Pude notar que as pessoas começam a reconhecer
O trabalho da gente;
Valorizar projetos e ideais
Depois dos 40 pude ver que cultivar rancores e inimizades
Não leva a nada.
Deixei de considerar os inimigos como tais,
Pois percebí que eles poderiam vir a ser
Meus patrões ou meus clientes.
Depois dos 40, já casado e com filhos
A probabilidade de ser avô se torna iminente.
Aparecem chances para se escrever um livro
Pois já há muita história pra contar.
Depois dos 40 conquistei prêmios,
Tornei-me mais ético, mais solidário, mais cidadão.
Mas também depois dos 40
Pude constatar com tristeza
Que 80% dos meus amigos da juventude, eram falsos.
Mas nos 20% restantes, encontrei verdadeiros anjos protetores.
Pra não dizer que tudo depois dos 40 é um "mar de rosas"
Eu também tive que gastar um dinheirinho a mais
Para comprar uns óculos de grau,
Implantar próteses auditivas,
Fazer exames de rotina;
Tive que realizar caminhadas diárias
Para diminuir o estresse e as dores lombares e musculares.
As relações sexuais que até os 30 chegavam a 3 por noite
Passaram a ser 3 por semana, por mês...
E assim sucessivamente.
É depois dos 40 que aparece uma vaidade incontrolável;
Uma afeição por voltar à juventude;
Uma vontade de viver sempre mais e chegar aos 50, 60...
Pois se descobre que quando se chega ao topo dos 50
A tendência é descer a escada.
O mais importante depois dos 40
É a sensação do dever cumprido;
É a colheita dos bons frutos das árvores plantadas;
É o cultivo de uma vida mais saudável,
Mais alegre e mais prazerosa.
É decobrir que o poeta estava certo
"Quem sabe faz a hora, não espera acontecer."
RAIMUNDO SANDRO CIDRÃO
Depois dos 40 pude perceber
Que a vida pode ser mais bela
Pois com a maturidade vem a experiência
Os gostos mudam; os valores mudam
A forma de ver o mundo muda também.
Pude descobrir e viver novas experiências.
Aprendi a me valorizar e a valorizar mais as pessoas
Ouvindo mais, aceitando mais, tolerando mais.
Depois dos 40 notei que cada marca deixada pelo tempo
Tem sua significação.
Que as pessoas podem nos amar, nos respeitar e nos vaalorizar
Por cada ruga em nosso rosto, por cada fio de cabelo branco,
Pelos sinais na pele, nas mãos.
Aprendi que é uma dádiva nascer, crescer, envelhecer
E depois morrer sereno e lúcido.
Poucos conseguem essa ordem natural da vida.
Percebí a importância que tem a maturidade, a terceira idade.
Depois dos 40 pude constatar
Que o prazer de beber está em degustar um aperitivo
E não em tentar consumir toda cachaça do mundo em uma só noite.
Pude notar que as pessoas começam a reconhecer
O trabalho da gente;
Valorizar projetos e ideais
Depois dos 40 pude ver que cultivar rancores e inimizades
Não leva a nada.
Deixei de considerar os inimigos como tais,
Pois percebí que eles poderiam vir a ser
Meus patrões ou meus clientes.
Depois dos 40, já casado e com filhos
A probabilidade de ser avô se torna iminente.
Aparecem chances para se escrever um livro
Pois já há muita história pra contar.
Depois dos 40 conquistei prêmios,
Tornei-me mais ético, mais solidário, mais cidadão.
Mas também depois dos 40
Pude constatar com tristeza
Que 80% dos meus amigos da juventude, eram falsos.
Mas nos 20% restantes, encontrei verdadeiros anjos protetores.
Pra não dizer que tudo depois dos 40 é um "mar de rosas"
Eu também tive que gastar um dinheirinho a mais
Para comprar uns óculos de grau,
Implantar próteses auditivas,
Fazer exames de rotina;
Tive que realizar caminhadas diárias
Para diminuir o estresse e as dores lombares e musculares.
As relações sexuais que até os 30 chegavam a 3 por noite
Passaram a ser 3 por semana, por mês...
E assim sucessivamente.
É depois dos 40 que aparece uma vaidade incontrolável;
Uma afeição por voltar à juventude;
Uma vontade de viver sempre mais e chegar aos 50, 60...
Pois se descobre que quando se chega ao topo dos 50
A tendência é descer a escada.
O mais importante depois dos 40
É a sensação do dever cumprido;
É a colheita dos bons frutos das árvores plantadas;
É o cultivo de uma vida mais saudável,
Mais alegre e mais prazerosa.
É decobrir que o poeta estava certo
"Quem sabe faz a hora, não espera acontecer."
RAIMUNDO SANDRO CIDRÃO
quarta-feira, 13 de agosto de 2014
POESIA
ERUPÇÃO
JÁ TENTARAM CALAR MINHA VOZ
E EU CANTEI;
JÁ TENTARAM ME IMPEDIR DE ANDAR
E EU DANCEI;
QUANDO ME DIFAMARAM EU CRIEI ASAS
E VOEI;
QUANDO VOEI
PLANTEI SEMENTES
EM VÁRIOS LUGARES
E AMEI!
JÁ ME FIZERAM CHORAR
E EU DRAMATIZEI;
QUANDO ME NEGARAM
O DIREITO DE EXPOR MINHAS IDEIAS
COMECEI A ESCREVER
E VIAJEI;
QUANDO TENTARAM ME JOGAR NA LAMA
ME FORTALECI
E DELA EMERGI
COMO UM VULCÃO
NUMA CONSTANTE
E VIBRANTE
ERUPÇÃO
DE VIDA.
Raimundo Sandro Cidrão
terça-feira, 12 de agosto de 2014
Crônica
“DONA RITINHA”
Eu tinha completado recentemente seis
anos, quando Dona Ritinha me convidou para andar com ela, substituindo minha
irmã de dez anos, já bem crescidinha. Ela combinou tudo com mamãe, e eu
aceitei.
Dona Ritinha era uma deficiente visual,
devota de Santa Rita de Cássia, que, ao ficar totalmente cega, foi abandonada
pelo marido. Vivia sozinha numa casa da Rua São Miguel, mas realizava todas as
tarefas domésticas, sem enxergar nada. Só precisava de alguém que a conduzisse às
casas para pedir esmolas. Eu fui o escolhido.
Saíamos um dia, no meio da semana,
visitando alguns pontos comerciais e Rua Grande (hoje Deputado Furtado Leite),
no Centro da cidade, batendo às portas das residências: “Uma esmolinha pelo
amor de Deus!”.
Eu a conduzia pela mão cuidadosamente,
avisando as descidas e as subidas, desviando dos buracos, evitando tropeços e
acidentes. Também carregava os gêneros doados em sacolas. O dinheiro, ela
colocava nos bolsos do vestido: um, para moedas e o outro, para as cédulas.
Nosso ponto de parada era a casa de Dona Lourdes Izidório, sua comadre. Lá,
sempre saía um pão com manteiga, um café com leite e uma boa conversa.
Ao chegar a casa, Dona Ritinha me dava
uma ajuda em dinheiro e outra em alimentos.
O que eu achava interessante era ela
reconhecer as moedas pelo tamanho e pelas saliências impressas, bem como por
particularidades mínimas no dorso das “pratas”, observações que para as pessoas
sãs, passavam despercebidas. Ela reconhecia as cédulas pelo tamanho e pela
textura.
Aos sábados bem cedinho, a gente ia ao
açougue pedir esmolas aos marchantes. Uns davam carne e toucinho; outros,
pelanca, osso, peia, nervo... Mas tudo era bem-vindo. Quando retornávamos, ela
me dava parte das “misturas”, que eu ia deixar em casa para melhorar o tempero
do almoço. Em seguida, voltava, para levá-la até a “braúna”, uma imensa e
frondosa árvore que cresceu ao longo das décadas no caminho de Inhumas. Lá, ela
ficava sentada num tamborete com uma “baciazinha” nas mãos, pedindo esmolas aos
comerciantes, vendedores e transeuntes que iam para Feira em Santana. De alguns
deles, ela se oferecia para ler a mão, baseada nos traços nela existentes.
Eu ficava brincando ali por perto.
Subia na porteira do curral que dava para as terras de Seu Carrim e Seu Valter,
depois pulava pendurado nos galhos da Braúna. Procurava “pedras de peixe”,
ninhos de passarinho, fazia esculturas com canos de milho e galhos de
“bamburrá”, modelava o massapé vermelho em tempo de terra molhada, e fazia
muitas imagens de santos.
Por volta das três para as quatro horas
da tarde, retornávamos. Independentemente da feira, a minha gratificação era
certa: sempre recebia alguma coisa, o que ajudava muito nas nossas despesas.
Chegando a casa, repassava o valor aos
meus pais, que me davam uma parte para gastar com material escolar e com
“besteiras” (bombom, pirulito, bolacha, picolé, etc.).
Tudo que eu ganhava de Dona Ritinha era
uma grande contribuição para família, que vivia apenas do que saldava com as
roças.
Com Dona Ritinha aprendi muitas coisas
para a vida. Ela me ensinou valores como: o respeito, a solidariedade, o
compromisso, a devoção, o otimismo, a lealdade... Deu-me sábios e valiosos
conselhos. Ensinou-me a rezar pelo meu Anjo da Guarda e pelo Anjo da Guarda do
meu bom amigo. Foi com ela que aprendi esta oração que até hoje rezo antes de
me deitar:
“Meu
Jesus crucificado
Filho
da Virgem Maria
Me
guardai hoje, nessa noite
E
amanhã pelo dia
Nem
meu corpo seja preso
Nem
minha alma perdida
Nem
meu sangue derramado
Pelas
mãos dos inimigos
Pois
com Deus eu me deito
Com
Deus eu me levanto
Com
a graça de Deus
E
do Divino Espírito Santo,
Amém.”
Raimundo Sandro Cidrão - Professor
Assinar:
Postagens (Atom)